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O que mudou na penitenciaria de Mirandópolis em 14

O que mudou na penitenciaria de Mirandópolis em 14 anos.

Penitenciária de funciona em condições subumanas

 

 

 
01/08/2006 00:00

Divulgação ACAT

Créditos da foto: Divulgação ACAT
SÃO PAULO – “Ficamos sabendo da situação no dia 16 de junho. Juntamos dinheiro entre nós e fomos para lá. Não conseguimos falar com o diretor, não conseguimos nada. Ficamos por lá 8 dias. Na semana seguinte fomos para Presidente Venceslau. O coordenador das penitenciárias da região Oeste disse que não teria vaga para transferências porque as outras unidades estavam destruídas. Fomos então pra Brasília. Não conseguimos falar com o Ministro da Justiça, mas o Paulo Vanucchi, secretário de Direitos Humanos, nos recebeu. Só disse que não podia fazer muita coisa porque o governo de São Paulo não quer aceitar a ajuda do governo federal”.

A saga de Lara de Cássia Mendes, auxiliar administrativa, mãe de dois filhos, e de dezenas de outras mulheres, é para garantir condições mínimas de encarceramento para seus maridos, detentos da Penitenciária Nestor Canoa, de Mirandópolis, no interior de São Paulo. Nesta segunda-feira (31), entidades de defesa dos direitos humanos lançaram um dossiê denunciando as condições subumanas a que os presos estão submetidos. Desde a segunda quinzena de junho, por conta da última rebelião que destruiu quase toda a unidade, cerca de 1.250 homens estão confinados num espaço reservado inicialmente a 120 pessoas.

Sem luz e água, muitos têm dormido ao relento, e são poucos os cobertores disponíveis. Tuberculosos, portadores e HIV e diabéticos não estão recebendo a medicação regular. As mulheres dos presos denunciaram ainda que vários homens estariam feridos a bala desde a entrada do Choque na unidade, no final de junho passado.

“Todos apanharam muito quando o Choque entrou. Quarenta e cinco presos, que estariam machucados, foram levados. Mas nós temos uma lista de 70 feridos”, conta Lara. Seu marido está preso há 13 anos por assalto. Antes, estava detido no presídio de Martinópolis, também no interior do Estado. Para ela, esta é a pior situação pela qual já passaram. No último motim, seu esposo teve a clavícula fraturada. “Nem na mega rebelião foi assim”. As visitas estão interditadas desde o início de junho, quando ocorreu a rebelião. A previsão é a de que recomecem de 3 a 5 meses depois do início das obras. O envio e recebimento de cartas também está praticamente paralisado.

A partir dos acontecimentos no presídio de Araraquara - que chocaram o país no último mês -, a Associação Cristã para a Abolição da Tortura (ACAT) começou a receber denúncias das esposas dos presos de Mirandópolis. “Elas contavam da tortura, da ação da Rota dentro dos presídios, que coisas semelhantes estavam acontecendo”, relata Eliane Grofe, membro da entidade. Segundo as esposas, pedaços de vidro têm sido misturados na alimentação, e a comida tem cheiro de urina.

"Nas poucas cartas que recebemos, eles dizem que estão bem, que não precisamos nos preocupar. Mas sabem que as cartas são lidas pelos agentes antes de serem enviadas. Sabemos, por presos que tiveram liberdade, que tem muita gente passando mal lá dentro, vomitando sangue", conta uma das mulheres de Mirandópolis, Valéria Magiopani.

"Eles estão sem água, sem comida, sem PS [assistência médica]. Queremos o mínimo de dignidade. Nossos maridos já estão pagando pelo que fizeram com a sua liberdade. Mas o que estão fazendo com eles é crime também. E quem vai pagar por isso?", se indigna Juliana de Almeida.

Para a ACAT, é preciso tomar providências urgentes para que os presos sejam transferidos de Mirandópolis. "Essas pessoas têm que ter um lugar digno para cumprir suas sentenças”, acredita Eliane.

As entidades encaminharam a denúncia contra o governo de São Paulo à Organização Mundial de Combate à Tortura, à Associação de Prevenção à Tortura e ao Fundo Voluntário das Nações Unidas em Apoio às Vítimas de Tortura. A Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo, que interveio no caso de Araraquara, também será acionada. Em parceria com a organização não governamental Justiça Global, a denúncia será encaminhada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos).

No próximo dia 7 de agosto, a Comissão Independente – que vêm cuidando dos casos de morte ocorridos durante a semana de 12 a 19 de maio, quando a polícia reagiu com força aos ataques do PCC – se reunirá com o Procurador Geral de Justiça de São Paulo, Rodrigo Pinho, e também pedirá providências urgentes do Ministério Público à situação da Penitenciária de Mirandópolis.

"Temos ainda que exigir do juiz da comarca, responsável pelas execuções penais, que visite o presídio uma vez por mês, pelo menos, para verificar se as condições são adequadas. Isso está previsto na lei e é conveniente que o juiz o faça, para que não peque por omissão em relação ao que está acontecendo", analisa Lúcio França, da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil).

Na avaliação de Ariel de Castro Alves, coordenador estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos, a Secretaria de Administração Penitenciária do governo de São Paulo e os funcionários do presídio de Mirandópolis também podem responder criminalmente por tortura. Para ele, colocar 1.200 pessoas onde cabem 120, sem água e nessas condições de alimentação, já configuraria a prática de tortura.

"As pessoas que estão no sistema prisional hoje são vítimas de barbaridades impetradas pelo próprio governo. Tratar presos desta forma só gera mais revolta e não resolve o problema", conclui Alves.

Luta feminina
“Meu marido está preso há 32 anos, 9 meses e 4 dias. Já passamos por várias rebeliões. Pra nós, mulheres, é difícil segurar a barra. É humilhante não ter dinheiro para pagar a passagem de ônibus na rodoviária. É ultrajante ficar sem roupa, ter que abrir as pernas e agachar para que outras mulheres nos revistem na entrada da cadeia. Na semana da visita, a gente já começa a preparar o jumbo [kit com alimentos e produtos de limpeza que as famílias levam para os presos] para o nosso companheiro. Não dormimos direito por causa da expectativa. È algo que bate profundo. Hoje eles estão sem médico, sem dentista. Meu marido perdeu os óculos na rebelião e está praticamente cego. Teve uma crise de hipertensão e não teve acesso a remédio, nem comigo comprando. Por sermos mulheres, sentimos mais. Cumprimos uma pena maior aqui fora”.

O desabafo da esposa de um dos detentos de Mirandópolis não retrata uma situação particular. São as mulheres e mães dos presos as que mais se entregam na luta por melhores condições de encarceramento no Estado de São Paulo. E as que mais sofrem as conseqüências dessa entrega.

Há cerca de um mês, Dircilene Batista de Lima foi presa, autuada em flagrante com 150 g de maconha em sua bolsa – droga que ela desconhecia, afirma. Dircilene é irmã de um dos presos da Cadeia Pública de Jundiaí, onde três detentos morreram este ano depois de terem sido baleados e jogados aos cachorros durante uma rebelião. Foi ela que levou os familiares dos presos para reconhecerem os corpos em Jundiaí. Também foi até Brasília, pedir a demissão do diretor da penitenciária, acusado de promover espancamentos periódicos na unidade. Por conta do suposto flagrante armado, ela ficou detida por 15 dias na Cadeia Feminina de Itupeva, no interior do Estado. Agora, está respondendo ao processo em liberdade.

Nesta segunda-feira, Dircilene participou do lançamento do dossiê sobre Mirandópolis e deixou uma mensagem para as mulheres de lá: “Tenham força até o último momento. Nós somos as pernas, braços e olhos deles aqui fora. Chega de tortura e covardia no sistema carcerário”.